Escrevo esse texto com um
aperreio no coração, brotado de minha participação na passeata,
manifestação/protesto/passeio carnavalesco acontecido ontem pelas ruas de
Recife/Hellciff/Recífilis. Sei das dificuldades de ler um texto longo, então
enumerarei minhas impressões/depressões/repressões acerca do que vi:
1. QUE P@#$% É ESSA?!
Foi o que senti ao chegar à praça
do Derby. Sentimento que pipocou ao ver tanta gente junta e tanta gente
visualmente chamativa. Minha memória de protestos é de gente vestida para a
guerra, clima tenso e o que vi foram sorrisos acetinados, aparelhos
resplandecentes, pais levando filhos como se fosse um domingo no parque
(lembrei de Gil agora, eita, que sintomático).
2. MÁSCARA DE GUY FAWKES?? F@#$%! CADÊ A CAMISA NA CABEÇA, CADÊ??
Segundo sentimento. Centenas de
pessoas com as máscaras do filme “V de Vingança” me fizeram indignação. Minha
formação de movimentos sociais de outras épocas apertou logo o botão vermelho
(vermelho bem antigo) e pensei que estava tomado por uma espécie de desfile
carnavalesco grotesco por ter as mesmas fantasias;
3. CARTAZES IMPRESSOS EM PAPEL COUCHÉ? E AS BANDEIRAS E FAIXAS PRESAS
EM PEDAÇOS DE MADEIRA?
Terceiro sentimento. Um monte de
cartazes plasticamente bem produzidos dividiam espaço com cartolinas e até um
mini ônibus feito de madeira (não tenho certeza) marcou presença em todo o
trajeto. O partidarismo repetido noutros
lugares do Brasil foi banido também do evento aqui em Recife. Um homem foi
agredido por trajar a camisa de um partido numa prova da ojeriza que grassa nas
movimentações. Senti falta das bandeiras que tremulavam em outros carnav...
protestos; apenas uma bandeira eu vi: a do movimentos dos trabalhadores rurais sem
terra;
4. CADÊ O CHOQUE? E AS BOMBAS? E OS TIROS? NENHUM ESTUDANTE FOI
ARRASTADO NUMA GRAVATA POLICIAL?
Quarto e talvez mais intenso.
Policiais com faixas brancas deram o “tom da paz” que é muito defendido nas
passeatas Brasil afora. Fiquei com aquela sensação de “tá faltando alguma
coisa, tá ligado?”. Violência mesmo só de algumas pessoas que roubaram ou
furtaram durante a passeata ou que quiseram aproveitar para fazer vingança.
Apenas um policial sofreu cortes de faca peixeira ao separar a briga;
Dois
grupos fecharam trecho da avenida Agamenon Magalhães e encontramos um deles
impedindo a passagem de veículos motorizados (senti quase um lampejo de emoção:
agora vai ter tiro!)
Encontrei amigos e amiga que
estavam com a mesma impressão que eu. Sentimos uma espécie de sentimento de
obsolescência, de superação de tudo que nos formou e nos conferiu identidade.
De descrença na possibilidade de mudança sem luta armada, sem destruir o que
garante a manutenção do responsável por todas as mazelas: o capital.
Embalado por Falcão, não o d’O
Rappa, mas o do Ceará:
sentei na mesa de um bar/comecei a meditar procurando a solução/pro
futuro da nação e do imposto predial...
Não cheguei ao ponto final, mas
algumas POSSIBILIDADES apareceram:
1. É UMA FORMA DIFERENTE DE ORGANIZAÇÃO.
Os modelos de protesto nos quais
a maior parte da população foi formada divergem de tudo o que foi visto no dia
20. Eles são melhores? Não me sinto confortável em responder. Eles irão obter o
que pretendem? (mas o que pretendem? Perguntaram alguns) Não podemos responder
sem uma nesga de dúvida. Mais do que tentar prever, considero importante
participar e pensar sobre o que pode ser feito hoje.
2. A VIOLÊNCIA É MESMO DESNECESSÁRIA?
NÃO DEFENDO A VIOLÊNCIA, mas é
importante considerar que ela esteve presente em todos os atos revolucionários
da História. Mesmo que mencionem Gandhi, lembrem o que aconteceu e quantas
pessoas morreram até que a Índia conseguisse a independência.
Nenhuma
revolução ocorreu sem a participação dos “radicais”, aqueles que enfrentaram, na
linha de frente, a força destrutiva do Estado. Considere também que sendo uma
forma diferente de organização, meios diversos serão elaborados.
Essa
violência, esse estouro é também resposta aos diversos tipos de violência e não
apenas a física que a maior parte da população vem sofrendo há um bom tempo e é
uma forma também legítima de protestar quando não atinge inocentes.
Se
estamos falando de uma suposta revolução, então deve-se considerar que nenhuma
revolução (nem as que se autodenominavam equivocadamente) aconteceu sem mortes
ou depredação de “patrimônio”. Seria essa a primeira? Já se provou que não.
Vale
notar que em uma das muitas transmissões dos protestos, foi veiculada a
informação que um grupo de vândalos (denominação frequentes nestes dias)
invadiu um mercado e não quis levar o dinheiro, apenas as mercadorias
(alimentação).
...
...
...
...
Pausa
tensa com o objetivo de representar a inexistência de comentário acerca desse
detalhe.
Outro elemento que deve ser observado com maior acuidade é o fato de se atacar sedes
do governo, bancos (representantes do status quo capitalista). Por que as sedes
e os bancos? Seria aquela reação contra a representação do poder instituído, e
o que o legitima, sintomática de uma percepção de quem é o “inimigo” comum? O chamado
vandalismo é apenas motivado por destruir
por destruir? Penso que não...
3. AS MÁSCARAS DE GUY FAWKES SÃO UMA APROPRIAÇÃO INTERESSANTE.
Tive, até o momento de conclusão
desse texto, duas possibilidades de entendimento:
(I) minha
geração esteve próxima – de certa forma – de seus referenciais de rebeldia, de
contestação; tinha Chico Buarque, Caetano, Gil, Che Guevara, professores que
instigavam os estudantes a agir e eram eles próprios atuantes (vi muitos de
meus mestres irem para a rua em prol de suas causas), hoje esses referencias
são, em comparação, inexistentes; artistas raramente engajados de verdade e
raros mestres fazendo o que pregam em sala de aula, logo, a ação, para esses
estudantes, estava mais difícil de acontecer por não terem em quem se espelhar;
(II) o
referencial que essa geração tem de rebeldia e ação contra o sistema opressor é
Guy Fawkes do filme V de Vingança e, indo além na análise ainda sob o calor dos
acontecimentos, nem seria desse filme e sim do grupo Anonymous, que se apropriou
da máscara e difundiu essa representação para o planeta como sinônimo de luta
contra injustiças e em favor do povo.
Assim, penso que se formos tentar
analisar esses acontecimentos, deveríamos trazer do limbo a imaginação sociológica, de C. W. Mills e
procurar ampliar o olhar. Estamos diante de algo bem diferente do que
historicamente aconteceu no país.
4. PARTIDOS POLÍTICOS.

Mas
pensei (mais uma vez lembrando: NO CALOR DOS ACONTECIMENTOS E SEM CARÁTER
DEFINITIVO) que a organização “desorganizada”, sem liderança é uma importante
mudança, considerando que muitas lideranças políticas não cumpriram o que delas
se esperava e ainda decepcionaram quem nelas acreditou.
Porém,
também penso ser quase injusto que aos partidos que tinham/tem em suas agendas
muitas das reivindicações orgulhosamente defendidas seja vetada a participação
e ocorra o rechaçamento de quem, porventura, busque participar e levantar a
bandeira de seu partido.
Mais
uma vez chamo atenção para o que afirmei acima: não sou contra ou a favor deste
ou daquele partido, mas busco pensar as possibilidades a partir do conhecimento
teórico e prático que tenho.
5. EM TEMPO: ATUALIZAÇÃO NECESSÁRIA – “A VIOLÊNCIA VOLTOOOOU!”
As manifestações seguintes ao dia
20.6 (e no final deste também)foram marcadas pela violência contra os
manifestantes e fez muitos entusiastas ficarem felizes pelo retorno das
passeatas “clássicas”, mas consideremos o seguinte: será que fazendo as portas
do comércio fecharem em dias de manifestação não estaríamos (e estamos) prejudicando “a burguesia” (para
usar a terminologia também clássica), pois um dia sem vendas é dia sem lucros?
Assim sendo, lembremos que policiais são apenas martelos, o braço que os usa está um pouco mais acima, logo...
6. TÉRMINO DO TEXTO SEM CONCLUÍ-LO.
Termino aqui o texto, mas não a
temática. Assumo que, agora, neste instante, meu aparato teórico e prático não
me dão certezas sobre o que acontece ou acontecerá. No que isso vai terminar
(se vai), não sabemos. Estamos envolvidos emocionalmente e nossa formação,
tanto intelectual quanto social e cultural, influenciarão sobre nossos juízos
de valor. A partir do conhecimento proporcionado pela História, o que podemos
intentar é EXPOR
POSSIBILIDADES, mas definir é uso equivocado do saber histórico; mas
continuo afirmando como em outra postagem:
Independente dos resultados e do
que aconteça, o despertar da população e toda essa quantidade de pessoas já
torna o evento histórico e lição para os administradores do país que,
parafraseando o clássico renascentista, sabemos que há algo de podre no Brasil
e que ESTAMOS DE OLHO E PASSAMOS A REAGIR. SOMOS
MILHÕES, VOCÊS, POUCOS...
Pense fora da CAIXA.
Tenha HISTÓRIA NA CABEÇA
Percebi as mesmas coisas de seu post, achei engraçado que até a revista capricho teve uma matéria falando de "como se vestir em manifestos para achar um gatinho". Uma das coisas que mais dialogo que hoje a revindicação é um anuncio de problemas óbvios, mas nada de projetos reais ou revindicações, muitos projetos que eles pedem são PL's ou PEC's que já existem e não tem nenhuma participação do povo para ser votados na câmara. Outra coisa que pode ter percebido também que a memoria politica deles só se encaixam neste governo, mal sabem de governos anteriores, muitos dos prejuízos do brasil vem do passado e eles andam impunes, não sabem quem é coligado com quem ou quem já apoiou quem, vejo muitos vendo a solução em pessoas que já governaram no passado e muitos que se deixaram virar propaganda desse males do passado. Enfim, a grande maioria moleque que acha que politica se faz assim como nos filmes e não veem que a realidade é bem diferente, tentar mudar sem nem conhecer o sistema que rege seu pais, se querem mudança geral, convoquem uma constituinte com participação do povo, não o peleguismo de ficar falando tudo sem uma unica solução cabível. Quem comunica o problema é bom chegar também com a solução e lembrem que depois da ditadura tivemos 6 presidentes, que ainda tiram onda por ai e só veem um único
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